A Engenharia de "Perdido em Marte"
- Roniel
- 7 de jan. de 2018
- 4 min de leitura
Como o filme de ficção científica vai além da ciência explicativa e se transforma em uma verdadeira aula disfarçada sobre o conceito de engenharia.

Aviso 1: O texto conterá spoilers do filme.
Aviso 2: Eu sei que o filme foi baseado em um livro. Um clássico da ficção científica, vale se ressaltar. Infelizmente eu não o li, mas minha análise a seguir vale para aspectos que podem existir tanto no filme quanto no livro e é isso o que importa.
Na última segunda-feira a Rede Globo apresentou o filme “Perdido em Marte” (The Martian, 2015) no programa Tela Quente. Eu já o havia assistido no cinema, na sua estreia lá em 2015, mas revendo o filme agora depois de um tempo uma reflexão veio em minha cabeça e me senti na vontade de compartilhar aqui.
Em 2015 eu estava em meu terceiro ano do Ensino Médio e passava pela fase “cinéfilo” da vida. Estava no auge da minha “apreciação pelos grandes filmes”, gosto por histórias mais interessantes e curiosas e namoro com a Ficção Científica. Em resumo, eram outros assistindo ao filme.
Quando enfim criei coragem para reassisti-lo, na já citada segunda-feira, pude perceber coisas que o Roniel de três anos atrás jamais teria notado. Mas é claro. O Roniel de 2018 tem uma visão mais analítica das situações graças aos conhecimentos e ideias adquiridas no curso de Engenharia.
Ao rever o filme, foi como ver algo totalmente inédito, como se aquela vez de 2015 nem tivesse existido. Ou como se essa última fosse mais impactante. Isso deve acontecer com vocês também em alguns filmes. Mas enfim.
O filme é um ótimo trabalho em diversos aspectos. Seja na abordagem científica ou na construção do personagem principal. Mas não foi um aspecto cinematográfico que mais me chamou a atenção e sim uma constatação explorada por durante toda sua extensão:
Perdido em Marte é uma verdadeira aula de engenharia
Um dos elogios mais frequentes recebidos pelo filme é sobre sua acertada aproximação com aspectos científicos realmente possíveis no ambiente marciano. De fato, a maioria das soluções científicas pensadas pelo astronauta Mark Watney tem sua aplicação comprovada em experimentos feitos. Mas não é sobre a ciência em si utilizada pelo sobrevivente que levanta a reflexão que proponho. E sim pelo próprio modo de uso da mesma.
Quando eu afirmo que “Perdido em Marte” é uma aula de engenharia é me referindo à maneira com que o astronauta aborda seus problemas e encontra as soluções para os mesmos.
É dito no filme que a grande especialidade de Mark é na área da botânica. Realmente seus conhecimentos sobre plantas acabou salvando sua vida (ops, spoilers). Mas o ponto não é exatamente esse. Frente a todas as dificuldades existentes de se habitar um planeta ainda sem vida, Mark bola e executa planos dignos de um engenheiro. E dos bons.
Toda a parte de análise da situação-problema, elaboração de uma abordagem e execução do plano são feitos de uma maneira louvável e dignas de horas e horas de apreciação.
A verdade é que:
Mark Watney é um engenheiro e não sabe. Alguém o avise.
Sobre a engenharia, toda essa parte de análise e resolução de problemas tem que vir acompanhada de uma comprovação numérica sobre o que se propõe fazer. A parte trabalhosa do método. E o marciano é brilhante no que faz
Desde todos os cálculos realizados para fazer a plantação de batatas levando em conta o ganho calórico de cada unidade necessário para sua sobrevivência por n dias, até o número de viagens a serem realizadas pelo Rover de forma a economizar combustível até chegar em seu destino final (uma das crateras do planeta).
A disciplina empregada no consumo de recursos escassos, como comida e energia; a capacidade analítica utilizada nos momentos chaves de tomada de decisão, como na cena de tentar produzir água para sua plantação ou quando precisou buscar uma forma de se comunicar com a Nasa através de códigos do sistema Hexadecimal, enfim. Esses detalhes permearam todo o filme pra mim. E parando pra pensar um pouco, foram eles os cruciais para a vivência do astronauta no Planeta Vermelho.
Além dos aspectos externos do conhecimento engenhoso, Mark Watney encontra em si próprio características que o fazem um perfil perfeito para o posto de engenheiro. Seja na proatividade de realizar seus planos, seja na sucessão de erros e acertos ou na sistematização das ações que faz.
Vale deixar uma frase do próprio astronauta dita já pelo final do filme, provavelmente alguns anos após sua proeza:
Você se vê então tendo que resolver o problema A e depois surge o problema B e logo depois vem o problema C. Você pode sentar e aceitar a situação ou pode tentar enfrentar todos eles, um de cada vez. Aí você terá alguma chance de escapar.
Gente, isso é Engenharia.
Claro que diferentes visões podem ser aplicadas ao mesmo filme e ele pode acabar se transformando em outras “aulas” também. A primeira que me vem em mente é a Psicologia, claro. Como se comporta a mente de uma pessoa por tanto tempo sob tamanho nível de estresse??? Como uma fuga de humor existe naquele ser humano à beira da morte? Como a música Disco dos Anos 80 não o matou antes da atmosfera tóxica de Marte?
Talvez essa seja a grande graça proporcionada por grandes histórias: a perenidade.
Não é só mais um trilho com começo, meio e fim, e sim uma fonte inesgotável de aprendizados, curiosidades, interpretações…
Perdido em Marte já provou ser um excelente Sci-fi para guardar nas coleções dos grandes clássicos da sétima arte e agora se mostra como um ótimo estudo de caso para aqueles que desejam saber mais sobre como é ser um engenheiro em diversas situações. Ainda que você seja um botânico abandonado num planeta sem ninguém.
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