A mecânica das histórias dramáticas
- Roniel
- 14 de fev. de 2018
- 3 min de leitura
Como o ser humano consegue causar emoção no outro apenas contando-lhe uma história? Aqui estão duas formas utilizadas amplamente pelas mais diversas narrativas para se alcançar tal objetivo.

Contar estórias é uma verdadeira e genuína arte do ser humano. Não por menos, causar os mais diversos sentimentos ao se contar uma peça de ficção a alguém ou a um grupo também pode ser considerada uma.
Historicamente o ser humano busca por pequenos retratos de suas mais humildes expressões espontâneas em imagens que procuram nos entreter com momentos de nossas vidas, contadas de várias e imaginativas formas. Desde os mitos e lendas no mundo antigo passando por séculos de evolução na maneira de como presentear os seres humanos com suas próprias emoções expostas.
Para isso o homem “criou” um mecanismo chamado arte com suas diversas engrenagens de diferentes tamanhos e formas: o teatro, a literatura, a música, a pintura, o cinema. Apenas para citar algumas delas.
E na história vamos contando estórias. De um ser humano para outro.
E é justamente aí que entram as emoções.
Afinal, como criar uma estória dramática, daquelas de arrancar as mais sinceras lágrimas, ou de fazer-nos ficar tristes com uma estória fictícia, ou felizes e aliviados com o sucesso do herói que nem existe na vida real?
A verdade é que não existe uma fórmula. A arte não é uma ciência exata.
Inconscientemente somos levados até nossas mais fortes emoções com mecanismos que, silenciosamente, passam por nosso corpo e atingem aquilo que guardamos.
Enquanto espectadores de uma bela estória, isso acontece da maneira mais natural possível.
Mas alguém pensou em fazer aquilo com você. Alguém “criou” o mecanismo que faria você sentir o que sentiu ao ler aquele livro, ouvir aquela música ou assistir àquele filme.
Falando especificamente do bonito ato de se contar uma estória, o artifício do drama pode ser criado de duas principais e diferentes maneiras: o drama interno e o externo.
O drama interno tem essa nomenclatura porque faz referência direta ao que está se contando em páginas, quadros ou cenas. O objetivo desta modalidade de drama é criar uma situação para as personagens (ou para apenas uma delas, em geral a protagonista) que façam com que o espectador sinta-se integralmente em sua pele.
Seguindo a proposta básica de uma obra de ficção, a de fazer as pessoas embarcarem em todos os detalhes daquela narrativa e esquecerem que podem sair delas a qualquer momento, o drama interno não faz mais que o dever de casa.
Você vê seu personagem preferido sentindo saudade, tristeza, medo ou felicidade e acaba por sentir o mesmo. É essa a graça de toda estória de ficção.

Cena do filme Interestelar (Interstellar, 2014)
Já o drama externo, como esperado, faz justamente o oposto. Sua proposta é a de subverter toda a ideia criada para estórias de ficção.
Em vez de fazer-nos entrar nas páginas ou na tela de uma boa narrativa, ao vermos nosso herói passando por determinada situação somos automaticamente transportados não para a cabeça dele e sim para a nossa.
Em determinados trechos daquele recorte de vida que chamamos carinhosamente de estória, podemos muito bem nos ver em um espelho mais do que individual ao acabarmos por cair em uma lembrança da infância ou de um fato que aconteceu no mês ou ano passado.
Essa modalidade é audaciosa, perigosa e sensível. Justamente a mais difícil de se alcançar por autores pois, como já citado, faz o papel oposto de toda a anatomia do que se contar e de, principalmente, como se contar. Tira o espectador de sua narrativa ficcional e o leva para a dele: reflexiva e pessoal.

Cena do filme Um Olhar do Paraíso (The lovely bones, 2010)
E assim as estórias contam estórias. Feitas por seres humanos e dedicadas a seres humanos.
Um drama singelamente dosado nunca faz mal a ninguém. E talvez seja através deles que aprendamos um pouco mais sobre essa vida real. Irônico.
Partimos de uma mentira para tentarmos nos inserir em uma verdade.
Irônico, mas não anormal para nós.
Historicamente fomos assim e assim continuaremos por um longo tempo.
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